quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Acarajé quentinho ?

Um desses dias estava andando por aí depois de ter tomado todas e na busca de um pouco de glicose para me "sobrear". Entrei em uma daquelas sorveterias repleta de incontáveis sabores e que nos deixam loucos. Loucos e perdidos. Mas no estado que me encontrava só conseguia pensar em chocolate com muito chocolate, chips de chocolate e calda de chocolate.
Fácil escolha !

Saí da sorveteria desfrutando minha casquinha com um tesão tão grande que é quase indescritível. Dou alguns passos, passo pelo posto de gasolina, viro a esquina e me deparo com um grupo de cinco ou seis mendigos e mendigas, ou melhor, na verdade eles eram "homeless" (infelizmente não temos em português uma palavra que substitua tão bem essa expressão), e uma delas vem em minha direção apenas para pedir dinheiro ou o sorvete.
Ela se aproxima, eu levanto os olhos do verdadeiro felaccio¹ que praticava em meu sorvete e nesse exato instante, nesse exato momento, cruzo olhares com ela. E ela me vê.

Sim, ela me vê. Porque até aquele cruzar de olhares eu era uma outra pessoa qualquer, um passante que subia pela rua e que poderia rendê-la com algumas moedas ou mesmo meu tão desejado sorvete de chocolat au chocolat.

Mas ela me viu. E mudando repentinamente seu discurso linear, comum, rotineiro, como daqueles vendedores ambulantes que entram no ônibus e recitam a mesma prosa, no mesmo tom, sem trocar uma palavra, parou e disse de improviso naquele falar malemolente que só o baiano tem: "Ia ti pidí essi sorveti, mas cê tá tão bem qui vô dexá cê aproveitá !!!

Agradeci com um leve balançar de cabeça e segui, pensando: ela me viu !!!
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Continuei andando, desfrutando mais e mais daquele ato sexual que se tornara o lamber, chupar, saborear e sorver meu sorvete e refletindo sobre aquele close encounter of the 3rd kind².
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Já reparou como as pessoas que fazem parte de nosso dia a dia, e que sem as quais seria bem difícil vivermos, nos passam quase invisíveis?
É o gari varrendo a rua TODOS os dias, o pipoqueiro ou sorveteiro com quem cruzamos em nosso exercício de caminhar diário, a vendedora de água de côco que nos alivia o calor no fim da caminhada e até a "secretária do lar" - nome politicamente argh correto para empregada doméstica - que está na nossa casa há anos, a qual perguntamos inercialmente como está a família e filhos, mas mal ouvimos a resposta ou mesmo depois de todos esses anos de convivência na nossa casa, com nossa família, nossos filhos - os seres mais importantes do mundo pra nós - sequer uma vez você visitou a mulher que ajuda, ou mesmo cria, seus filhos, sequer você sabe onde ela mora.

Essas pessoas são invisíveis pra nós.

E, recentemente, tive essa mesma sensação, ao contrário. A de que nós também somos invisíveis pra eles: estava sentado na praia, após comprar um acarajé oferecido por uma menina que já havia passado por mim umas dez vezes e, logo após, quando já estava chegando à metade do prato, ela passa mais uma vez por mim, para na minha frente e pergunta:
...Acarajé quentinho ?



¹ sexo oral
² contato imediato do 3º grau

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Condenado a viver !

Andando por aí passo por pessoas pobres, miseráveis, sem uma vida digna, sem ter onde morar decentemente, sem a garantia de um prato de comida, um aleijado, um pedinte, um mendigo dormindo sobre folhas de papelão, outro revirando o lixo tentando encontrar algo pra comer, um grupo fumando crack, um bêbado completamente apagado junto ao meio fio... Afinal eles não tem nossa “sorte” de ter uma casa, uma geladeira cheia, saúde, uma boa cama, um bom plano de saúde, dinheiro pra comprar um antidepressivo....e o anti depressivo do pobre é a cachaça; do miserável, o crack.

E a culpa de quem é? Existe um culpado? Afinal em tudo que acontece em nossas vidas temos que culpar alguém, e culpamos nossos pais por certos comportamentos que temos, pela maneira que nos influenciaram, quando na verdade eles também estão aprendendo “são crianças como você”, culpamos o governo que não faz o que achamos que deveria fazer, culpamos o status quo, culpamos a vida...e do outro lado um milionário paga 35 milhões de dólares para ser turista espacial por uma semana, um outro perde 10 bilhões de dólares em investimentos com a crise de 2008/2009 e nem se coça.

Que Merda !!!!

O pior de tudo é sentir que a vida é uma prisão da qual não temos o direito de fugir e temos que aguardar o Supremo Carcereiro nos torturar até o último momento, e somente aí, quando a pena estiver cumprida receber a autorização para sair desse cárcere.

Dizem alguns que, já que estamos presos e não temos escolha a não ser permanecer aqui até o fim, temos que transformar essa prisão da melhor maneira possível, ou seja, conseguir lençóis limpos, um bom colchão, ficar amigo dos líderes do pavilhão, conseguir umas quentinhas com boa comida ou então fazer uma ligação elétrica para esquentar o almoço e poder comer algo aquecido e saudável. Na hora do banho de sol, jogar uma bolinha, bater um papo com os outros detentos, pendurar uma cortininha de banheiro pra ter alguma privacidade na hora de dormir, aprender uns joguinhos de carteado e dominó pra passar o tempo, e cultivar amizades já que essa prisão é perpétua. E, por assim ser, tentar levá-la da melhor maneira possível.

Mas como levar da melhor maneira com todas essas misérias, dificuldades, exploração, corrupção, roubo, egoísmo, ostentação de alguns poucos que se sentem superiores aos outros?

Algumas culturas, como a japonesa, eles tem suas saídas. Na nossa, o “suicídio” e a eutanásia são vistos como um crime contra a vida e contra o espírito.
Independente de ser ou não, dentro de cada cultura sou a favor de abreviarmos o sofrimento em qualquer sentido. Um câncer terminal e mesmo a decisão da "professorinha" Leila Lopez de encerrar a vida porque pra ela “já deu”. Chegou. Acabou. Tava bom. Suficiente.

Pra mim parece que a melhor maneira de viver é juntar-se aos seus, aos seus amigos, familiares, mantê-los próximos da melhor e mais pura maneira possível. Ter empatia pelos que sofrem e tentar minimizar suas dores, ajudar aos que mais precisam, nem que seja dedicando pelo menos algum tempo para ouví-los ou contribuindo com instituições e se importando de verdade, um pouco de pouco é muito mais importante que muito de nada.

Se quisermos sofrer menos durante essa estada na carceragem temos que tentar diminuir o sofrimento dos outros: não dando o peixe, mas ensinando a pescar; não dando a soma mas mostrando como calcular e assim, independente de quem seja a culpa, que no fundo é de todos nós, essa busca ficará em segundo plano, pois tentando remediar o sofrimento alheio de uma maneira sincera, remediaremos o nosso e quem sabe nossa pena possa ser reduzida por bom comportamento, podermos cumprir liberdade condicional e em breve estarmos livres.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Sei lá...

Andando por aí me pego assoviando a música de Toquinho e Vinícius, ouço pessoas cantarolando, rádios tocando, chego em casa e dou de cara com a TV passando a novela e tenho que admitir que Toquinho, Vinícius, Buda, Krishna, Jesus, Kardec “tem sempre razão” pois a vida é Maya.

Algumas vezes as pessoas consideram o conceito de "maya" niilista*, porque supõem que ele signifique que tudo é totalmente irreal e, portanto, sem valor. Mas a natureza essencial de uma ilusão é que ela, na verdade, aparenta ser totalmente real; tem de ser convincente ou não poderá ser chamada de ilusão, e essa ilusão tenta levar Buda para o “dark side of the force”.

Poizentão: se tudo é uma grande ilusão, porque nos apegamos tanto a essa “matrix”? Se tudo não é nada mais nada menos que a maneira que nossos cinco limitados sentidos percebem as coisas em volta, então porque nos apegamos tanto? Porque precisamos preencher esses sentidos, desde os mais básicos aos mais fúteis, já dizia Maslow.

A Kabala por exemplo, diz que não captamos nem 1% do que existe a nossa volta, que os laços que interligam todos nós com todo o universo são invisíveis e infinitos, e que estamos todos interrelacionados, interligados, que os karmas nos amarram cada vez mais uns aos outros e os outros aos uns....e mesmo assim nos apegamos.

Creio que nos apegamos a essa vida, a esse mundo, como o homem que está se afogando tenta se agarrar de qualquer forma a qualquer coisa que bóie e possa lhe manter em contato com o que ele conhece. Ou talvez nos apeguemos a tudo aqui apenas por medo do desconhecido. Ou não... Daí o apego a zona de conforto e ao status quo sejam as coisas que as pessoas mais prezam.

Sei lá.

Só sei que eles* estão com a razão.

*Buda, Krishna, Jesus, Kardec, Sai baba, Vinícius....

*Niilismo (do latim nihil, "nada") é uma doutrina filosófica e política baseada na negação seja da ordem social estabelecida, seja de todas as formas de esteticismo, assim como na defesa do utilitarismo e do racionalismo científico. Influenciado pelas idéias de Feuerbach, Darwin, Nietzsche, Henry Buckle e Herbert Spencer, o niilismo surgiu na Rússia czarista do século XIX. Segundo Martin Heidegger, o termo foi empregado pela primeira vez em 1799, pelo filósofo alemão Friedrich Heinrich Jacobi. Mais tarde, o romancista russo Ivan Turgueniev o empregou para designar a concepção que, afirmando a existência apenas do que é perceptível pelos sentidos, negava tudo o que se fundamenta na tradição e na autoridade.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Terráqueos

Andando por aí, adoro observar o trabalho das formigas, principalmente as cortadeiras. E aqui pelo nordeste elas proliferam...quanto mais quente e úmido o clima mais elas se espalham. Adoro observar os insetos, sua organização, seu modo de viver...

Falando em formigas, insetos os quais admiro muito, elas estão nesse planeta há 100 milhões de anos, mantém sua organização, seu equilíbrio, se comunicação por feromônios – o que demonstra que, de uma certa maneira são uma espécie inteligente, algumas até se unem como uma pequena balsa para atravessar córregos e pequenos camihos de água. Emendando o pensamento, lembro das baleias que vivem na Terra há 50 milhões de anos em perfeito equilíbrio e também se comunicam entre elas. E lembro de que nós surgimos há “somente” três milhões de anos e entramos de sola !!! E olha que apenas há 6000 anos inventamos a escrita, que foi o primeiro passo pra essa evolução que começamos a atingir nos últimos 300 anos com a revolução industrial e no fim do século XX com a revolução da comunicação através da informática e tudo isso sem nenhuma preocupação até o momento, estamos apenas usando o que o planeta nos oferece e esquecendo que isso aqui é uma biosfera fechada e finita.
É como se a Terra fosse uma nave viajando pelo espaço, carregando bilhões de DNA´s diferentes em direção a não-sei-onde e com fontes limitadas.

Quem nos deu o direito de assumir que somos a raça superior nesse planeta? Quem nos fez acreditar nessa inverdade e manter por alguns milênios a posição de nós somos a raça escolhida? Porque, mesmo passados séculos de descobertas, ainda nos sentimos o centro do universo?

Se o Universo tivesse surgido há 24 horas nós estaríamos aqui há apenas 2 minutos. E nesses 2 minutos já causamos mais estragos no planeta do que todas as espécies que viveram aqui antes. Quem disse que somos mais inteligentes que as outras espécies, que sempre viveram em equilíbrio até que nós chegássemos e “bagunçássemos o coreto” com a nossa ambição de “melhorar” o ambiente onde vivemos.
O problema é que da mesma maneira que os colonizadores se achavam melhores e mais espertos que as civilizações “inferiores” que descobriam e dominavam, apenas porque tinham mais poderio bélico, nos impomos sobre as outras espécies como se nossa maneira de “ver” o mundo fosse a mais certa.
Cada ser, cada espécie tem uma maneira diferente e própria de enxergar o mundo e interagir com ele e não existe uma mais certa que a outra, são apenas diferentes. Nem melhores nem piores. E temos muito que aprender com todas elas e não simplesmente usar os “seres inferiores” para nos servirem.

E me questiono: quem são os terráqueos? Não são TODOS os habitantes desse planetinha?

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

40 minutos do segundo tempo

Creio que a maioria das pessoas já foi ao menos uma vez ao estádio curtir uma partida de futebol e mesmo os que nunca foram já devem ter assistido algum jogo na televisão e reparado que muitos torcedores, independentemente do resultado da partida, começam a sair do jogo por volta dos 35, 40 minutos do segundo tempo. A justificativa em geral é a de que não querem enfrentar o tumulto da saída do estádio, a desorganização do estacionamento, o trânsito engarrafado ou mesmo ônibus ou vagões lotados no metrô.

Com essas desculpas perdem os cinco minutos finais de uma partida que pode sofrer uma reviravolta importante, pois afinal, futebol é futebol e já tive grandes emoções nesses minutos finais, como gols de virada, golaços de título, que o diga o Rondinelli em 78 e o Pet em 2001 entre outros fatos fantásticos como o último minuto de Croácia x Turquia na Eurocopa de 2008.

A idéia não é discutir futebol, mas sim o quanto deixamos de aproveitar situações em nossas vidas simplesmente porque temos medo de algo acontecer fora do nosso controle ou de dar errado e por esse receio corremos pra porta de saída antes da festa acabar, antes do jogo terminar com medo do “tumulto” que isso possa causar e criamos várias desculpas para explicar porque deixamos de curtir momentos que poderiam ter se tornado importantes e relevantes em nossas vidas, e assim não nos envolvemos plenamente numa relação por medo que ela dê errado e acabamos criando uma profecia auto-realizável, isto é, quanto mais acreditamos na possibilidade de algo acontecer, mais podemos influenciar no seu acontecimento e o que mais temíamos acaba acontecendo.

Muitas vezes ajo dessa maneira, mas tenho aprendido a esperar o jogo ir até seu final e depois espero a grande massa de torcedores sair, os tumultos se dispersarem, o metrô tranquilizar e saio, satisfeito por ter aproveitado a partida até o final, mesmo que o resultado não tenha se alterado nesses últimos minutos, mesmo que o resultado final não tenha sido o que esperava, mas ao menos fiquei ali, me envolvendo, torcendo e tentando aproveitar cada minuto desse “jogo”

terça-feira, 3 de novembro de 2009

A raça pura ou a raça puta?

Andando por aí me deparo com a “pureza” da raça alemã, dos vikings escandinavos, do típico estereótipo de um francês, a branqueza dos arianos britânicos, a "amarelizidade" dos japoneses ou ainda a negritude azulada dos africanos e me vem uma pergunta? Porque algumas culturas tem sempre que querer definir a superioridade de uma raça por um simples detalhe que é a cor da pele? Definir a superioridade de um grupo, de uma religião, de um sistema político, de uma linha de pensamento, sobre outro?

Krishnamurti diz em seu livro A Educação e o Significado da Vida que “...as crenças, as ideologias e as religiões organizadas nos põem contra nossos semelhantes; há conflitos não somente entre comunidades diferentes como também dentro da mesma comunidade...” e continua... “Há também a questão do patriotismo. O Patriotismo não é evidentemente uma emoção natural. Somos diligentementes estimulados a ser patriotas pelos meios que nos incitam ao egoísmo racial e pelo ensino que nossa maneira de viver é melhor que a dos outros.”

Apesar de nossa libertinagem pós ditadura militar, onde mesmo o que era bom e funcionava foi negado ao extremo – que na verdade é um comportamento humano normal, pois quando vivemos sob o jugo de uma filosofia, idéia ou religião imposta e nos libertamos tendemos a negar e corremos para o lado oposto - no nosso caso ainda estamos buscando o equilíbrio de nossa jovem democracia e de nossa jovem liberdade. Mas quanto às raças somos o país mais democrático que existe. Nos misturamos, tentamos nos aceitar – menos os corintianos e os palmeirenses e os flamenguistas e vascaínos – e avançamos, e talvez por isso mesmo por essa grande mistura estejamos criando a raça mais “impura” possível, onde nosso DNA carrega um pouco de cada cor, de cada raça e comportamento do planeta, vemos isso pela valorização do passaporte brasileiro no mercado negro, já que qualquer um pode ter a cara de um brasileiro.

Afinal, qual a cara do brasileiro ? Todas e nenhuma. Se por acaso surgir um vírus que ataque todas as raças que se dizem puras, o que sobrará? A raça puta, aquela onde todos os sistemas de defesa se misturaram, onde todos os DNA´s se mesclaram...não é isso uma das teses de defesa da evolução humana, da seleção natural defendida por Darwin. Aquele que mais se adapta ao ambiente é o que sobrevive???

É... certos estavam os portugueses que "pegavam" todas e nos legaram essa herança, essa raça linda, gingada, saudável, livre, leve, solta, deliciosa e sem identidade definida, sem um perfil padrão. A nossa raça brasileira.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Novos sabores, novos lugares, novas experiências... ou não

Almoço de dia das mães na casa de Tia Livinha e Tio Rodolfo que na verdade não são meus tios, mas os considero demais. Adoro vir aqui. O clima de família, o ambiente leve, a energia que Tio Rodolfo passa com sua paz e seu equilíbrio. O controle sobre tudo que está se passando e o envolvimento da Tia Livinha com cada um dos presentes. Você sente o amor no ar, como bem disse Clarissa, neta deles e com quem estava conversando nesse almoço, mais um dos vários que faço questão de comparecer sempre que estou em Salvador.

E conversando na mesa onde estava comendo uma maravilhosa salada com molho de yogurte e gengibre, surgiu o assunto de experimentar sabores, lugares, culturas e claro, minha viagem acaba aflorando na conversa que se transforma num debate sobre experimentação.

Conhecimento, crescimento, evolução, só surgem com experimentação, mesmo que seja uma experimentação ao acaso. Estar sempre buscando um sabor novo e não ficar só repetindo os maravilhosos sabores que já conhece é como ficar viajando pra cidades e países diferentes, ao invés de estar sempre indo pro mesmo país, pra mesma cidade, simplesmente porque foi o que mais te agradou e, mesmo que tenha que repetir um país ou cidade, buscar cidades diferentes dentro da mesma cidade, caso contrário pode perder a oportunidade de desvendar e conhecer coisas novas que podem até ser piores ou melhores que a anterior, mas ao menos você experimentou e agora sabe.

Isso acontecia frequentemente na minha viagem pelo mundo, pois encontrava uma cidade deliciosa, aconchegante, com ritmo, vida noturna e diurna, aproveitava cada instante e ficava tentado a ficar ali mais tempo, mas... e a próxima cidade, o próximo país? Poderiam ser tanto ou mais interessante que o que estava e mesmo que não fosse ao menos eu teria experimentado e como dizia Thomas Edison depois da milésima tentativa de criar a lâmpada elétrica: ao menos já descobri 1000 maneiras de como não fazer.

Eu descobria lugares que muitas vezes eram até interessantes, mas que não tinham a energia que eu buscava naquele momento.

A tentação de sempre pedir os mesmos sabores, de fazer as mesmas coisas, ir aos mesmos locais e cidades, de ficar em um determinado lugar que te agradou vem da eterna preguiça que nosso cérebro tem em trabalhar, ele tende sempre a buscar a zona de conforto, onde ele já está acostumado com todas as sensações e prazeres e assim se sente “em casa”, não precisa ficar buscando interpretações para cada coisa nova que vai acontecendo, para cada hábito novo que surge em seu caminho, para cada comportamento que inicialmente ele acha estranho e exótico, para cada sabor inicialmente bizarro. Assim nós nos deixamos controlar pelo nosso cérebro que nada mais é que mais um órgão do nosso corpo e que não é o que somos na verdade.
Afinal somos muito mais que apenas um órgão de nosso corpo, independente de sua importância.
Não somos apenas um coração, um fígado ou muito menos somente nosso cérebro.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

A ilha desconhecida

Viajar pra se conhecer ou viajar pra conhecer?
Viajar pra se conhecer e viajar pra conhecer?
Viajar sem se conhecer e sem conhecer?

Saramago tem um conto que se chama a Ilha Desconhecida e se resume a como vou me comportar ou quem sou (serei) eu quando lá chegar.

Por isso viajar não deve ser somente conhecer um lugar novo, uma cultura nova, comportamentos, sabores e cheiros mas, principalmente querer se conhecer.
No meu caso não é uma fuga de mim mesmo, mas um encontro comigo mesmo (já que fugimos disso o tempo todo no nosso dia a dia com medo do que podemos encontrar); é querer descobrir algo em mim que não tenho a oportunidade de conhecer dentro da sociedade onde vivo, do estilo de vida que me cerca, pelas modernidades e materialidades que me envolvem.
E não me restrinjo somente a viajar para poder me conhecer. Em todos os nossos relacionamentos creio que buscamos nos conhecer, ou mesmo, nos esquecer de quem somos.

Amo um lugar pelo que ele me faz tornar-me e gosto de me ver me comportando daquela maneira. Amo um amigo(a) pela maneira que ele(a) me faz sentir quando estou em sua companhia (mesmo que seja virtualmente). Amo uma mulher pelo que ela me faz sentir e pela maneira que passo a agir e o prazer que esse comportamento me proporciona, ou seja amo um lugar, um amigo, uma mulher pelo que me torno quando estou em sua companhia.
Amo viajar pelo “deslocamento” que isso causa em mim. Pelos relacionamentos que desenvolvo comigo mesmo quando encontro uma nova “ilha”, uma nova situação com a qual não havia me deparado antes e descubro uma nova faceta minha, uma nova maneira de me comportar, quando descubro que há algo em mim que sem esse relacionamento, sem esse deslocamento talvez nunca viria a conhecer.

Por isso me relacionar, por isso viajar é muito mais que conhecer lugares fora de mim, mas é mergulhar dentro de mim mesmo sob a influência de impressões, sensações, ambientes e comportamentos totalmente diferentes de tudo que conheço e já vivi.

O prazer, e às vezes o desprazer, de encarar o eu adormecido, o eu desconhecido que não se deixa aflorar nas situações corriqueiras, conhecidas e familiares do dia a dia da rotina diária.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Quando a saudade termina?

Em uma das muitas cidades por onde passei, e da qual não me recordo o nome, me deparei com uma placa no momento que cruzava os limites da cidade que dizia: aqui começa a saudade de “Palmira”

Tenho vivido uma sequência de “começos de saudade” desde que me dou por gente e tudo o que vivi, vi e senti construiu algum tipo de sentimento, algum tipo de memória em mim.
Claro que guardo com saudades os momentos positivos pelos quais passei, mas acho que a primeira saudade que construímos é aquela do lugar que nos foi destinado ao nascer ou então do lugar onde fomos criados ou ainda do lugar onde criamos raízes. Mas, e no meu caso que não tenho raízes?
Voltar pra onde? Voltar por quê?
Em todas as viagens que fiz sempre defini um retorno, uma data aproximada, mesmo não tendo raízes, mas ainda acreditava que o Brasil era o meu lugar, acho que nem tanto pelo país, tampouco pelos amigos, afinal construí algumas boas amizades nos países onde morei e em alguns que passei, mas por causa da família.
Creio que essa vontade de voltar fica sempre martelando na cabeça (ou seria no coração?) de todos que deixam o “seu lugar”.

Mas quando essa saudade começa e quando ela acaba?

Parece-me mais simples definir quando começa. E acho impossível definir quando acaba. Ao menos aqui nessa existência material, porque mesmo que voltemos pro lugar que deixamos, encontramos o mesmo local, mas em época diferente, num tempo distinto. Assim, enquanto esperamos voltar e reencontrar o que deixamos, podemos nos frustrar, porque o tempo passou e tanto o que deixamos, quanto “quens” deixamos, mudaram. E mais, nós mudamos, desenvolvemos uma maneira diferente (nem melhor nem pior, apenas diferente) de ver e sentir as coisas e ao nos depararmos com a realidade que havia ficado e já não é mais, nos sentimos perdidos no tempo e no espaço e por isso acabamos oscilando sempre entre a vontade de viajar de novo e a saudade do que vimos, fizemos e conhecemos e também da “saudade do que ainda não fiz”.

Acho que aquela placa deveria ser mais completa e dizer; “aqui começa a saudade de Palmira... e que nunca vai se apagar, mesmo que você volte.

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Cultura e Dança

Taquaruçu, Tocantins, Novembro de 2008

Sabe quando você vai visitar um lugar e dele não espera nada? Claro isso é um pouco de preconceito, afinal Tocantins é no meio do Brasil e Taquaruçu no meio do Tocantins. Naturalmente depois de ter rodado o mundo, me enfurnado em lugares no interior do Tibet, da Índia, do Laos entre vários outros buracos em vários outros países, eu não deveria mais ter esse tipo de preconceito, percepção, expectativa ou qualquer que seja o nome que esse comportamento tenha.

Vim pra cá visitar uma grande amiga, que foi a responsável pela capa, por toda a estrutura gráfica, como também da escolha da gráfica onde meu livro foi impresso, sem contar também que em vários momentos durante a minha viagem foi a inspiradora de algumas discussões internas de alguns questionamentos que expus em alguns capítulos do livro.

Não esperava encontrar nada. Claro, sabia que haveria uma estrutura básica, com bares, restaurantes, ruas, casas, bla bla bla, mas fui surpreendido positivamente pelo nível de desenvolvimento urbano que a região, ao menos a que conheci, ao redor da capital apresenta. As estradas, as ruas, as avenidas, a organização urbana, a segurança, a tranqüilidade, a infra estrutura, tudo, mas tudo mesmo, lembra como deve ter sido os primórdios de Brasília.

Nos quatro dias que passei aqui, e pena que foram poucos, pois não houve tempo para visitar o deserto do Jalapão, conheci os recantos da cidade e no fim de semana subimos a “serra” e viemos curtir alguns momentos nesse canto que é Taquaruçu. Cidade pequena, mas aconchegante, gostosa de se estar, de se caminhar, sem o calor extremo e sufocante que temos em Palmas, e para selar a seqüência de surpresas na praça principal da cidade tem um espaço curtural, onde as pessoas podem se apresentar, ou praticar, ou ter aulas, ou.... e me deparei com uma sessão ou seria uma aula, de dança onde um professor dançarino que me parecia estrangeiro, dava aulas de expressão corporal ao vários e várias alunos(as) da cidade, onde eles se perdiam no espaço, se tocavam , se encontravam, rolavam, dançavam se mexiam, se entrelaçavam, interagiam. Foi uma grande surpresa, entender como mesmo em rincões perdidos e desconhecidos do país tem sim pessoas que se importam com a arte e que usam os espaços possíveis para praticá-la, para exercitá-la.

Foi mais uma quebra de paradigma, de preconceitos....vivendo e aprendendo.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Passageiro, Motorista e Trocador.

Floripa, 18 de abril de 2008

Estou em Floripa mais uma vez. Depois de ter vivido aqui por três anos e meio, curtido as praias – nem todas, afinal são 42 e acabamos elegendo as que mais gostamos – curtido as baladas – na verdade ficava mais pelo “centrinho” da Lagoa da Conceição onde morava e onde estão concentrados a maioria dos bares e danceterias da cidade – curtido os restaurantes mais gostosos e escondidos, como um no Pântano do Sul, uma praia linda e tranqüila no sul da ilha que tem um restaurante famosíssimo mas que esconde um bem simples, caseiro e delicioso, do qual não consigo lembrar o nome, no cantinho esquerdo da praia e curtido também os que existem em Santo Antonio de Lisboa e ao lado em Sambaqui, ou ainda pegar uma “baleeira”, que nada mais é que uma pequena traineira ou “poc poc” como chamam no nordeste, por aproximadamente meia hora e cruzar a Lagoa da Conceição quase toda para comer no Cabral, ou passar uma tarde de inverno num dos cafés espalhados pela cidade, desfrutando de um bom papo com os amigos...enfim...soube aproveitar bem meu período por aqui, e agora voltei pra abrir minha exposição de fotos sobre a viagem no recém inaugurado Floripa Shopping.

Estou hospedado na casa/escritório de dois ex estagiários meus da época em que era Diretor Comercial da Macedo e como não tenho pressa de chegar aos lugares tenho tomado ônibus para me deslocar para a exposição, para as entrevistas na RBS e mesmo pra rever locais que adorava e visitar amigos.

Nessas idas e vindas da minha vida, nessa volta momentânea a Floripa, nesses reencontros fugazes com pessoas que foram muito importantes no período em que vivi aqui, pessoas que estavam presentes no meu dia a dia, que partilhavam vitórias e derrotas, alegrias e tristezas, pessoas com quem passava o dia na praia em um bom jogo de frescobol, com quem desfrutava horas de conversa nos cafés do Postinho na Lagoa, com quem saia na noite ou simplesmente encontrava nas baladas, com quem me relacionei intimamente e me envolvi emocionalmente e que hoje fazem parte sim da minha vida ainda, mas de uma maneira mais distante, como pessoas que em algum momento compartilharam momentos dessa minha curta existência, entendo o quanto somos apenas passageiros por aqui. Nós e todos que passam em nossas vidas. Passageiros em dois sentidos: no sentido de estarmos passando e passageiros no sentido que não somos nós que controlamos.
Tentamos conduzir nossas vidas, fazemos planos, vislumbramos nossos objetivos, construímos um caminho, mas não somos nós que controlamos.

Tinha um objetivo, um plano, um desejo e de repente tudo mudou...afinal quem é o motorista? Eu mesmo? EU conduzo minha vida, por estradas que EU construo ou será que sou um mero passageiro nessa história toda, passando por experiências que me farão crescer e entender um pouco mais a razão dessa existência ?
Me responda: o que você acha que acontece ? Somos passageiros ou motoristas? Ou somos os dois, sendo que em determinados momentos um e em determinados momentos outro? Ou será que somos apenas trocadores, observando quem passa e nos deixando levar por um outro alguém que conduz?

sábado, 6 de junho de 2009

Suicídio ?

Ipanema, Rio, maio de 2009

Dentro de mim não é um bom lugar pra viver.
Li essa frase em um poema de Maria Rezende.
Estava andando pelo calçadão de Ipanema. Parei pra assistir o treino da filha da Isabel do vôlei. Sentei na calçada, de frente pro mar e com o olhar perdido no horizonte, entre um saque e uma cortada comecei a pensar......na substituição dos que passaram, na renovação da vida, na reciclagem de comportamento, em como as gerações se vão e outras as substituem, em como nós nos substituímos...

Se dentro de mim não é mais um bom lugar pra se viver, o que faço?
Pra onde levo minhas coisas, minhas experiências, tudo que aprendi nesses anos de vida?
Pra onde vou?
Pra outro corpo? Como?
É fisicamente impossível, mas por incrível que pareça é espiritualmente viável.
Como?

Renascendo, se reinventando. Reconstruindo a vida, indo em busca de novos caminhos.
Creio que a cada ciclo que terminamos ou que sentimos terminado, que esgotamos, temos que nos reinventar. Talvez esse período que passei viajando tenha sido uma reinvenção da minha vida, ou um resgate. Talvez esse período pós viagem tenha sido uma continua busca de uma maneira de retornar a um modelo antigo, uma vida que não existe mais e que por estar insistindo tanto eu esteja com um sentimento de que não dá mais pra viver dentro de mim, e então tenho que buscar saídas.
E a saída é o suicídio.

Não..... Não o suicídio físico, onde se dá fim a esse corpo, mas o suicídio de uma maneira de viver.

Deixamos de viver uma vida de uma maneira e buscamos alternativas, outras que nos sejam mais interessantes, desafiadoras ou mesmo mais cômodas. Saímos de uma pequena cidade e vamos estudar na grande. Terminamos a facul e encontramos emprego em outro Estado. Somos promovidos e mudamos de país. Casamos e temos filhos e mudamos completamente nosso estilo de vida. Pedimos demissão, somos demitidos ou mudamos de carreira. Fazemos outra facul. Nos separamos.
Em cada mudança, em cada passagem deixamos muito pra trás e recomeçamos tudo de novo.
Já fiz isso algumas vezes. Algumas compulsoriamente, pois quando tinha 14 anos nos mudamos para o Rio e deixei todos os amigos pra trás, a escola, o clube, e mudei minha vida. Mais tarde tranquei a facul e fui morar na Europa. Voltei e meus amigos, minha cabeça, minha vida era outra. Me casei, investi na carreira e mudei minha vida. Me separei, viajei pelo mundo e mudei minha vida. Creio que agora está na hora de novamente eu ser um bom lugar preu viver....de mudar minha vida.
Renascer.

domingo, 31 de maio de 2009

Forrest Gump

Arapongas, Paraná, novembro de 2008


É, vim parar no interior do Paraná. Morei em Curitiba por dois anos mas acabei não conhecendo o interior, e agora surgiu essa oportunidade que foi o convite do SEBRAE para que eu palestrasse na Semana do Empreendedorismo.
A cidade é pequena, claro, mas muito gostosa, principalmente porque estamos na primavera, e a vista que tive no trajeto do aeroporto de Londrina até aqui e a que tenho do meu quarto no hotel, que é o edifício mais alto da cidade e que me possibilita uma visão de quilômetros para todos os lados, me mostram um mar verde quase totalmente plano. São quilômetros e quilômetros de plantações como eu só havia visto no norte dos Estados Unidos e que me surpreendeu. A cidade em si é plana, com um movimento calmo de pessoas e veículos, mas que tem uma influência marcante na região pela quantidade de indústrias moveleiras, e por isso o SEBRAE aproveita para divulgar seus cursos e convidar palestrantes que possam falar de empreendedorismo. E aqui vim contar minha história.

É delicioso ter a possibilidade de compartilhar com as pessoas experiências que tive durante esse dois anos pelo mundo, acrescida claro das experiências da vida acadêmica e corporativa desses últimos anos, mas o mais interessante é poder estar ali contando minha história. Acho que todos nós temos uma história pra contar, alguns de nós mais de uma... e todas são interessantes, todas tem algo a acrescentar em nossas vidas e sempre aprendemos muito com elas, independente do quão grandes ou pequenas elas foram, do quanto pareceram importantes no momento em que aconteceram ou só passado algum tempo nos demos conta do valor dessa ou daquela experiência, mas é preciso que sejam contadas para não se perderem no tempo, e se encerrarem como história ou como experiência não compartilhada no momento em que nos formos.

As minhas histórias não são melhores ou piores que qualquer outra, mas eu as conto. Minhas opiniões não são as mais acertadas ou as mais erradas, são apenas minhas e eu as exponho. Gosto tanto da sensação de compartilhar falando quanto gosto da sensação de compartilhar escrevendo. Falo e vejo pela reação das pessoas o efeito que aquelas palavras estão exercendo ali. Mostro vídeos e fotos e as pessoas entram ainda mais no clima da viagem. Leio pequenos extratos do meu primeiro livro e o público mergulha de vez na minha narrativa e no momento que conto também aprendo, pois vejo todos os fatos com os olhos daquele momento e servindo ao público me sirvo dele e de suas reações para enfatizar e reinterpretar um fato ou outro. E quando escrevo tenho o prazer de dedilhar e analisar cada palavra que coloco no texto e poder sentir o efeito que o conjunto delas me causa e que espero poder causar em quem decidir ler meus textos.

Não sou escritor, mas escrevo. Não tenho a facilidade de lidar com as palavras e com o texto como alguns amigos meus, jornalistas, tem, mas busco colocar o que sinto em cada uma delas, em cada texto, em cada apresentação. Não sou sociólogo ou psicólogo ou mesmo filósofo, mas tento analisar as coisas mais simples e óbvias do cotidiano, que muitas vezes nos passam despercebidas exatamente por serem do cotidiano, mas que não deixam de ser importantes. Gosto da Palavra espremida, sentida, sussurrada, sugada, cheirada, gritada, exaurida, degustada, dita, bem dita, mal dita, atirada, jogada, lançada, deixada, escutada, abandonada, ouvida, falada, amada. Gosto da palavra e do efeito que ela me faz. Ponto.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Ixperteza

Rio de Janeiro, março de 2009

Foram dez anos morando fora do Rio. Dez anos passados em cidades brasileiras que prezam pela educação e pela civilidade, como Curitiba e Florianópolis. Claro que não tão organizadas, limpas e educadas quanto à maioria das cidades do Velho Continente, mas ainda assim um exemplo de comportamento para o resto do Brasil.

No início do ano voltei a morar no Rio, num apartamento que tenho na Tijuca, onde até recentemente morava minha irmã antes de falecer. Minha vontade e a curiosidade de voltar eram grandes, afinal muitos amigos ainda tenho por aqui, as praias onde fui criado, o ambiente de Ipanema, das caminhadas pela orla principalmente no domingo pela manhã, a cerveja no Baixo Gávea, a corrida na Lagoa, os jogos do Mengão no Maraca, os amigos do Jardim Botânico, além claro de toda a beleza da natureza, das montanhas e do mar.

Agora, estando aqui todos os dias, analiso o comportamento carioca com uma visão de quem nasceu e viveu por aqui por 32 anos, que conviveu com o esse comportamento, mas que por ter estado fora durante esses dez últimos anos desenvolveu uma visão, digamos assim, imparcial, e percebi detalhes que não teria percebido se nunca houvesse morado em outras cidades e outros países. O que mais me incomoda aqui é que, em qualquer momento, sem descanso, o carioca em geral está pensando em como posso tirar vantagem dessa ou daquela situação - tenho sempre a impressão que serei passado pra trás em algum momento – os ixpertus já vão dizer: é porque tu é “pato”. Acho que isso é histórico: quando estamos numa fila longa tem sempre alguém “tentando encontrar um amigo”; se a fila é curta tem sempre alguém “desapercebidamente” tentando furar; se estamos no trânsito e a curva pra direita está engarrafada os carros começam a cortar pela esquerda e tentar se enfiar láááá na frente; quando o sinal (semáforo, sinaleira) está para fechar em um cruzamento engarrafado, o carioca acelera pra cruzar antes que feche para ficar na frente dos que vão vir do outro lado, sem pensar que estará fechando o cruzamento e bloqueando o trânsito. E isso é o tempo todo.

O Guarda Municipal vê a infração, mas como “não é de sua alçada” o infrator fica impune, assim ele finge que faz seu trabalho, ficando ali, naquela esquina, parado fingindo que trabalha enquanto conversa com os amigos, com as mulheres que passam ou com outros guardas.
O Polícia Militar finge que policia, passeia com sua patrulha pela cidade, liga a sirene dando a entender que persegue algum suspeito pra poder avançar o sinal ou para correr desnecessariamente no meio de um engarrafamento, estaciona em qualquer lugar, pois, afinal, está "policiando".
Os Legisladores fingem que legislam, enquanto na verdade estão ali na câmara municipal ou na assembléia estadual apenas defendendo os próprios interesses.
E a pergunta é a seguinte: se estivéssemos no lugar deles, faríamos diferente? Talvez respondamos que sim, mas no momento, no dia a dia do trabalho será que também não nos deixaríamos envolver?

O grande problema é que um tira vantagem e ganha em cima do outro, e esse sistema contínuo, se transforma num ciclo “pernicioso” e no final o outro acaba tirando vantagem em cima do um, e essa relação ganha-perde, se transforma em uma perde-perde onde poderia ser uma relação ganha-ganha, pois a energia gasta bolando maneiras de se dar bem poderia ser usada em bolar maneiras da sociedade como um todo evoluir o que seria benéfico a todos, sem exceções.
Todos querem levar vantagem e todos acabam perdendo e o ganho se torna momentâneo naquela situação, mas em outra onde você não domina, ou não tem o poder ou o conhecido certo, você acaba perdendo. Esse é o círculo vicioso que deteriora todo o Brasil, mas principalmente o Rio de Janeiro.
O brasileiro vive de burlar regras, só pensa nas vantagens individuais e nunca no coletivo.

E o carioca acha que é ixpertu !!!


Se o Brasil é o país do jeitinho, o Rio é a capital da ixperteza !!!

terça-feira, 19 de maio de 2009

MIND THE GAP

Rio de Janeiro abril de 2009

No metrô de Londres em quase todas as estações existe o aviso MIND THE GAP que, traduzido ao pé da letra, significa cuidado com o vão (entre o trem e a plataforma) e numa das vezes que tomei o metrô em Willesden Green, quando lá morava, me peguei pensando nesse gap (vão) que temos dentro da gente - o que somos e no que queremos nos transformar - em como as viagens contribuem pra diminuirmos esse gap e chegarmos mais próximo da nossa essência, dos nossos valores, daquilo que realmente gostamos e acreditamos.... ou não. Quantas pessoas passam por ali, se atentam ao gap entre a plataforma e o vagão mas não param por nenhum momento pra pensar nesse gap interno?

Durante a minha volta ao mundo, senti em vários momentos uma grande dor no coração, posso dizer que acontecia com certa freqüência, em média a cada quatro dias, pois era quando deixava uma cidade em direção à outra, deixava pessoas que conheci e que sabia que nunca mais veria, deixava países que cruzei e onde provavelmente nunca mais pisaria...essa nostalgia sinto até hoje. Creio que qualquer pessoa que tenha saído do seu canto e ido conhecer outras cidades, países, culturas, pessoas, vai morrer "satisfeitamente" frustrada sempre... É o preço do conhecimento, pois conhece muitos mundos mas só pode viver em um, quando o seu mundo ideal seria misturar o melhor de todos eles num só....mas essas despedidas que nos causam nostalgia, nos fazem crescer, porque cada uma delas é como uma pequena morte e um pequeno renascimento e tudo isso nos faz sentir vivos....

A volta? Nova vida? Claro que não é simples, afinal você vem com percepções do mundo muito mais abrangentes do que as que encontra nas pessoas que aqui ficaram, mas aprende a entender que a percepção do mundo de quem sempre ficou na caverna olhando as sombras passarem do lado de fora, como escreveu Platão, sempre será diferente daquele que ousou e foi ver o que de verdade havia do lado de fora....e na verdade, isso ainda é um micro passo em relação a tudo que podemos, e um dia vamos, descobrir. Além disso, muitas pessoas te vêem como um pária, pois você foi lá fora, viu além das sombras e traz informações que as pessoas não querem ou não estão prontas para ouvir, hábitos e conhecimentos novos que muitas vezes assustam o comportamento pré estabelecido, visões do mundo muito além das discussões e do rame-rame do “dia a dia cotidiano” e que podem “corromper” o modus vivendi a que todos estão acostumados. Assim, muitas vezes, a reentrada no mundo tido como real não é nem um pouco simples, nem do seu ponto de vista, que evoluiu de uma maneira diferente dos que ficaram, mas que também desenvolveu uma adaptabilidade e compreensão bem melhor do mundo que nos cerca e assim consegue voltar a se encaixar na sociedade que vivia, mas também por parte dos que aqui ficaram, que tem dificuldades em assimilar novos conceitos e comportamentos.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Borboletas Amarelas

Salvador, Bahia, abril de 2009

Estava mais uma vez por aqui em Salvador, visitando meu “irmão” Sérgio, Fernanda e as meninas, meio que pra passar a Páscoa meio que pra fugir das águas de março no Rio, e aconteceu um fenômeno que me fez ficar “viajando” naquele momento e analisando por que gosto tanto da Bahia, e principalmente por que gosto tanto de estar em Salvador.

É uma cidade que me atrai em todos os sentidos imagináveis. Tem um ar que emana ritmo, cultura, com longas praias com coqueiros e uma outra maravilhosa “fechada”, bem pequena, logo após a entrada da baía – Porto da Barra – pela qual sou completamente apaixonado, que tem todo o seu charme, com uma murada antiga, degraus largos e lentos, dois fortes demarcando o início e o fim da praia, pessoas caminhando pelo passeio e admirando as banhistas, parando prum acarajé ou simplesmente - se é que podemos chamar de simplesmente - admirando “O” pôr-do-sol que se recolhe ali sobre a ilha de Itaparica com todas as cores e tons de púrpura e laranja, tons esses que normalmente só encontramos em revistas de moda ou decoração... e tudo isso me traz lá do meu mais remoto banco de memória, recordações de parte de minha infância passada em São Pedro d´Aldeia, de frente pra uma lagoa tão salgada como bacalhau seco e como quase todos os lugares onde passamos a infância, ou parte dela, também tinha um pôr-do-sol todo próprio que sumia dentro das águas da lagoa, deixando somente o céu em tons de turquesa ou as nuvens multicoloridas... e onde pela primeira vez na minha vida consegui escutar claramente o ruído das chamas do sol em seu primeiro contato com a água do mar, se resfriando até apagar... shhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhiiiiiiiiiiii...

A Bahia, mas principalmente Salvador, e mais exatamente o Porto da Barra, exerce um efeito quase mágico em mim, a mistura de todas as cores, de todos os ritmos, dos gringos tentando entender o que não está ali pra ser entendido, mas para ser sentido, dos turistas brasileiros do sul invejando a facilidade comunicativa, a interação social, os negros com sua batida, seu ritmo de vida, sua ginga, os brancos tentando aprender o que é essa malemolência cultural que só o bahiano tem. Toda a Bahia tem esse ar, é um estado que poderia ser um país totalmente independente e viver bem de sua natureza... o mar, a montanha, as praias, as ilhas, enseadas. Na cidade, a história, as igrejas, o ambiente que te remete a tempos passados. Nas ruas as pessoas com um ar sorridente, leve, preocupadamente despreocupados, meio num-to-nem-aí-estando.

Esse momento, sentado aqui no condomínio de casas onde mora o Sérgio, entre as dunas de Stella, com o céu do mar no horizonte, a brisa leve batendo acalmando o sol e observando essas milhares de pequenas borboletas amarelas, se esforçando todas e-xa-ta-men-te na mesma direção, e para todos os lados que olho elas ocupam o céu, tento entender de onde vieram, pra onde vão e porque esse vôo, porque todas, porque naquela direção e me pego pensando a mesma coisa de nós.... e a única coisa que concluo é que se continuarmos “voando” na mesma direção, com firmeza, segurança e confiança, sentindo, mesmo sem saber o porquê, que estamos fazendo a coisa certa e no caminho certo, quando chegarmos lá, saberemos o porquê

domingo, 26 de abril de 2009

Diário de um dia a dia

Rio de Janeiro, abril de 2009

Pensa que é fácil?
Apreciamos as pessoas que conseguiram vencer, como atletas, executivos, comerciantes, músicos, atores e nunca pensamos um momento sequer nas dificuldades que eles tiveram pra chegar ali. Muitas vezes vemos suas casas maravilhosas, seus bens, suas vidas, suas famílias e pensamos que eles devem ter compactuado com algo ou mesmo roubado pra chegar à posição que estão e não enxergamos que na grande maioria das vezes eles apenas acreditaram. Eles tinham uma meta, se dedicaram, miraram nela e foram atrás. Não pensamos nas dificuldades que se impuseram no dia a dia antes de conseguirem alcançar seus objetivos, realizar seus sonhos, como por exemplo: acordar pela manhã e saber que o dinheiro está acabando, que tem contas pra pagar e que ainda não está surgindo nenhum convite, nenhum trabalho, que eles não sabem se amanhã estarão aqui ou acolá, mas mesmo assim continuaram se dedicando na busca da motivação pra encarar outro dia sem resultados... mas com a certeza que está no caminho certo, sabendo que está seguindo seu coração. Diferentemente de quem tem um emprego certo, uma vida rotineira, onde se sabe que acorda, se banha, toma café e sai de casa com rumo certo prum trabalho, prum escritório... que no fim do mês o dinheiro estará na conta te esperando.

Nem sempre é fácil tomar o caminho do “diferente”... Como a minha viagem. As pessoas pensam que tudo foi fácil, que foi como férias, que era só diversão, que foi só colocar a mochila nas costas e sair, mas não pensam em como foi complicado organizar, levantar informações – sabe quanto custa uma Coca-Cola no Laos? Sabe o custo de uma refeição no Camboja ? - saber que não poderia me apegar a nada e a ninguém, pois em pouco tempo não estaria mais ali... Não deixa de ser uma pequena morte, mas também um renascimento, a cada dia.

Nesses últimos meses após meu retorno, estruturando meu futuro, o que visualizo pra mim, o que gostaria de fazer nos próximos anos, minha palestra, meu site, mais viagens, minhas exposições, escrever outro livro, pode não parecer, mas é difícil e solitário. E o mais difícil todo dia é encarar um novo dia e saber que nada ainda está pronto, que os resultados ainda vão demorar a chegar. É duro enxergar. Cada dia coloco um tijolo e demora. Depois de alguns dias sei que terei uma parede, mas ainda não se pode morar numa parede, é preciso construir a casa e isso leva tempo e paciência, coisas que são muito difíceis de lidar.

Creio que todos entendemos claramente que se dedicarmos tempo e focarmos, vamos conseguir alcançar as metas, mas provar-se isso todo dia é difícil. Na maioria das vezes nós só vemos o resultado final. O nadador que bateu o recorde e recebeu a medalha, mas não enxergamos a quantidade de esforço, de dedicação e que pra isso acontecer teve que treinar “N” horas por dia, se superar, ter quase nenhuma vida social. Sofreu a cada dia por um momento de glória. O jogador de basquete que depois do treino continuou sozinho na quadra treinando arremessos enquanto os amigos saiam pra balada. O jogador de futebol que ficou treinando faltas, enquanto o resto do time ia pra praia. O estudante que virou noites e fins de semana com a cara no livro enquanto os amigos curtiam e viajavam. A grande maioria das pessoas do mundo cumpre sua obrigação, somente a obrigação e depois vão curtir, e se dependesse desses o mundo apenas girava. Os que seguem seu coração são os que vão fazer a diferença, que irão fazer a humanidade avançar porque saíram de sua zona de conforto. Mas sofreram. E quando olho pra trás sei que varias decisões que tomei poderiam ter sido mais fáceis se tivesse seguido o padrão, mas preciso construir o que realmente gosto, só não achava que ia ser tão complicado e lento

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Aeroportos e Rodoviárias

Salgueiro, Pernambuco, julho de 2008

Sinto um prazer inexplicável em viajar. Não. Acho até que é explicável, ainda mais para quem convive comigo, direta ou indiretamente e acompanhou minhas viagens pelo mundo.
Algumas pessoas viajam única e exclusivamente por obrigação. Eu o faço por prazer, sempre. Sempre foi assim e continua sendo, mesmo que seja a trabalho, mesmo que a grana esteja curta, mesmo que não dê pra ir de avião e tenha que ir de ônibus ou de carona, hospedar-me em albergues ou casa de amigos dos amigos, mas viajar.

Adoro o cheiro da estrada, parar e olhar para o “fim” de uma reta sem fim, ver um carro se aproximar por um lado e ir sumindo do outro, imaginar o que vem depois, ouvir o ruído dos pneus do ônibus me levando pra uma nova cidade, imaginar o que me espera naquele novo lugar, com aquelas novas pessoas.
Adoro também aeroportos. Aquele clima de pessoas indo e vindo, principalmente quando EU estou indo ou vindo. Só em olhar um avião cruzando o céu, minha mente se perde imaginando quem são as pessoas que ali estão, quais suas histórias, pra onde seguem, o que as esperam... como a letra do Toquinho e do Vinícus em Aquarela

“...Entre as nuvens vem surgindo um lindo avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo com suas luzes a piscar
Basta imaginar e ele está partindo, sereno e lindo...”

Passei por centenas de rodoviárias e aeroportos, pelo Brasil e pelo mundo e enxergo bem a diferença do “clima”, do ambiente entre eles. Nas rodoviárias as pessoas são mais simpáticas, emotivas, calientes e envolvidas com as despedidas, até porque no ônibus as pessoas podem se aproximar, vir até a janela se despedir. Nos aeroportos o oposto. Tentam manter uma frieza, talvez até pelo medo que muitos tem de avião, não se misturam, se despedem muito antes de partir, pois tem que entrar antes de embarcar e mal falam umas com as outras.
Mesmo com a perda do antigo glamour que esse último tinha, ainda há uma grande diferença de comportamento, pois não só nesses mas em qualquer outro lugar que se esteja, os “pobres” sempre são mais solidários do que os “ricos”. Vemos aquele que pouco tem ajudar alguém na rua; em bairros pobres e numa cidade pequena as pessoas se apóiam enquanto na cidade grande não sabemos nem quem são nossos vizinhos, pois parece que não queremos passar pela possibilidade de sermos importunados.

Durante a viagem acontece o mesmo. Nos aviões, por mais longo que seja o vôo poucas pessoas se falam, conversam. Já numa viagem de ônibus, depois de algumas horas, algumas paradas, já sabemos a história da família de boa parte dos passageiros. Frequentemente tomava o ônibus do Rio para Salvador, 26 horas de viagem e na parada em Realeza já sabíamos quem era quem. Imagina quando fui a Fortaleza...44 horas !!! Aracaju..32 !!! e outras mais curtas Brasília, 16. Floripa, 18....

Mas hoje, parado no meio do Sertão de Pernambuco, a caminho de Fortaleza, olhando as pessoas nessa pequena rodoviária aqui em Salgueiro, me sinto em casa. Me sinto aquecido. Me sinto vivo. Vendo lugares que nunca vi. Saboreando as pessoas, seus comportamentos, seus olhares, seus sotaques, suas maneiras de ser e agir. E isso que sempre tenho buscado. Vida.

domingo, 12 de abril de 2009

Sexta-feira da Paixão....

Itapuã, Salvador, Bahia, abril de 2009

Passei muitos anos sem pisar aqui...nessa ponta de praia, e sigo com os olhos a linha do mar, deslizo por coqueiros e paro pra apreciar o perfil da cidade do Salvador ao fundo. Venho sempre comer um acarajé em Cira ou um bejuzinho na Tapiocaria que fica na esquina bem em frente, mas nunca mais havia seguido até a beira do mar pra curtir o visual.
Quando da primeira vez que estive em Salvador em 87, Itapuã ficava muito distante de onde estávamos hospedados, na verdade creio que ficava longe de qualquer referência que tínhamos da cidade, e não só pela distância, mas porque tudo era mais longe há 20 anos atrás...
Depois que passei a me hospedar mais próximo sempre encontrava uma desculpa pra não ir além de Cida ou do beju...ou mesmo do Creperê*.

Ano passado, ciceroneando uma amiga gringa, a trouxe até o farol de Itapuã e me surpreendi com o visual – já não lembrava mais como era – e comecei a (re) entender porque passar uma tarde em Itapuã deve ter sido algo tão prazeroso no último terço do século passado, afinal, a brisa, o cheiro, a linha do mar e os coqueiros desalinhados no horizonte e os poucos, ou nenhum, prédios na época, com certeza deixavam essa fantástica vista muito mais leve, mas ainda hoje pode-se maravilhar com o que ainda é.

Mais uma vez aqui pra comer um bejuzinho, resolvi pedir o que mais me atrai que é o de carne seca com catupiry. Delicioso, o cheiro, a consistência, o recheio....quase tão bom quanto o que minha mãe faz e quanto o que comi em João Pessoa no “Tapiocódromo” na Praia de Tambaú.
Fui saboreando cada pedaço enquanto apreciava a vista quando, não sei por que, de repente lembrei que era sexta-feira da Paixão e “não se come carne nesse dia”.
Como assim esse pensamento veio à minha cabeça?
Como assim não se come carne ?
Como assim se não sou católico e isso é uma regra dessa religião?

E percebi o quanto fica marcada a programação que inserem na nossa cabeça quando nosso “HD” ainda está vazio, até pela influência externa, já que estamos num país de maioria ainda “católica” e que, mesmo não sabendo muito bem porque, todos marcam almoço em família ou com amigos e nunca servem ou pedem carne....é um dia no qual instintivamente pensamos em comer peixe, e quando me peguei comendo carne e pensando sobre o assunto, que em qualquer outro dia seria um tema irrelevante, me dei conta dessa programação e no quanto outras programações nos fazem sentir culpados, incomodados e/ou fracos em determinadas situações, que muitas vezes parecem simplórias para quem veja de fora. Temos fobias, comportamentos, sensações que sequer sabemos o porquê, como o medo que tenho de lugares muito apertados sem uma saída clara e que, principalmente, me aperte os ombros...por quê? Sensações assim é que me deixam muito curioso para entender de onde meu cérebro assumiu essa programação, quando ele foi marcado a ferro por esse ou aquele sentimento.

E aqui, sentado nessa murada, comendo meu bejuzinho de carne seca com catupiry refletindo sobre esse assunto e admirando a vista que Toquinho e Vinícius descreveram tão bem em sua música, sigo “...com olhar esquecido no encontro de céu e mar... sentindo o arrepio do vento que a noite traz...”


*nome de uma creperia